Minha mãe Lúcia e minha irmã Ilná
As
rugas no rosto do já idoso Mestre Patativa do Assaré são como os
sulcos da terra nos períodos de secas...
Tempos
atrás, reli o poema Mãe preta – oração de um filho a sua
mãe prêta (aquela que nos cuidou com todo carinho e nos enebriou
com sua histórias de princesas, rainhas, assombrações e de bichos
mansos e também aqueles mais ariscos que, cuidadosamente, nos
recomendava atenção.
Patativa
do Assaré nos comove com sua poesia tão singela e ao mesmo tempo
forte e de tamanha abrangência – perpassa toda a trajetória da
nossa vida – retrata os Ritos de Passagem em todos os seus
aspectos: nascimento, meninice, adolescência, juventude, fase adulta
e finalmente, a morte. E todos estes ritos são acompanhados dos
ensinamentos que vamos recebendo em cada fase da vida e, preservando:
o seio materno, as canções de ninar, as brincadeiras, os prazeres,
as dores, o distanciamento e finalmente a separação...
Cada
um de nós teve suas mães pretas... àquelas que nos encorajavam a
enfrentar os medos e as dores. Na ocasião em que reli o poema fiquei
completamente comovida e, por este motivo decidi publicá-lo. aqui,
no mês de mães e marias... Somos todas marias, marias, marias,
mães, mães, mulheres, mulheres – as detentoras da sabedoria oral,
aquelas que não precisam de assinaturas nem carimbos. Afinal, foram
elas que ensinaram nosso poeta,
Patativa do
Assaré, a compor,
rezar e cantar...
O
poema dedicado a mãe preta nos envolve a todos; e, a morte – este
último ritual porque passamos e que, tal e qual o nascimento é
totalmente individual e solitário. É também emocionante como
Patativa elabora a relação homem x natureza. A primeira e a última
estrofes centralizam, anunciam, sintetizam e enceram a narrativa do
poema: coisa de MESTRE, Patativa do Assaré.
*
O
coração do inocente,
É
como a terra estrumada,
Qui
a gente pranta a simente
E
a mesma nace corada,
Lutrida
e munto viçosa.
Na
nossa infança ditosa,
Quando
o amô e a simpatia
Toma
conta da criança,
Esta
sodosa lembrança
Vai
batê na cova fria.
*
Mamãe
com todo carinho,
Chorando
um bêjo me deu
E
me disse - meu fiinho,
Sua
Mãe Preta morreu!
E
ôtras coisa me dizendo,
Sinti
meu corpo tremendo,
Me
jurguei um pobre réu,
Sem
consolo e sem prazê,
Com
vontade de morrê,
Pra
vê Mãe Preta no céu.
*
*
Foi-se
embora Patativa
Mas a lira ficou viva
Para não morrer jamais
Nem sonhos, nem ideais
Porque não morre o poeta
Que no céu foi fazer festa
E viver entre imortais
Patativa do Assaré
Sertanejo cuja fé
Ensinou a viver mais
Patativa foi-se embora
E o Nordeste todo chora
A triste separação
De doer no coração
Deste homem que viveu
Modesto como nasceu
No seu querido sertão
Ensinando ao nordestino
Que sofrer não é
destino
Mas retrato da opressão
Filho nativo da terra
Cantou belezas da serra
De Santana, Ceará
Filho nativo de lá
Encantando o brasileiro
Como exemplo timoneiro
Como mais forte não há
Mas, com a “triste partida”
Dói bastante a despedida
Que o retirante nos dá
Da vida não teve medo
Disse sem pedir segredo
Com sua fibra mestiça
E a coragem por premissa
“Caboclo cabra da peste”
Foi defensor do Nordeste
Sem vaidade ou cobiça
Buscou paz e liberdade
Para todos a igualdade
Inspirado na Justiça
Pregando a reforma agrária
Viu que a luta é necessária
Proclamava sem cessar
O desejo de mudar
“Que a santa verdade encerra”
Os “camponeses sem terra”
Jamais podem prosperar
Era a ideologia
Que pregava noite e dia
E aprendeu sem estudar
A fonte patativana
Da cultura será chama
Para sempre flamejante
E de inspiração constante
Aos motes de cantorias
De cordéis e de poesias
Como faço neste instante
Com os meus versos singelos
Para quem tantos mais belos
Não mais fará doravante
Noventa e três de existência
Confirmando a resistência
Produziu a vida inteira
Com a verve costumeira
Tendo por musa o sertão
Que cantou de coração
Numa paixão verdadeira
Adeus, Patativa, adeus
Não choram somente os seus
Mas a Nação brasileira.
José Walter Pires
(05/07/2012)
*
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